Os objectivos centrais deste post são, por um lado, chamar a atenção
dos bosses do PAIGC, governantes, classe política e governados/cidadãos guineenses para acreditarem
na lenda de David e Golias; e por
outro lado, dizer à comunidade
internacional que a Guiné-Bissau precisa de uma chance para a sua
estabilidade política. Neste sentido, farei uma análise em quatro partes.
1ª parte: As imagens acima, de uma mulher de tanga, de um homem
em cuecas e da posição de Saramago
sobre a esquerda e a direita, pretendem ilustrar a actual situação política da Guiné-Bissau, onde todos parecem buscar
apenas os seus interesses e não os
da nação e povo guineenses.
2ª parte: Em primeiro
lugar, recordo aos leitores o evento em que o constitucionalista português Jorge Miranda afirmou que o Presidente
da República «PR» da Guiné-Bissau, José
Mário Vaz, «Jomav», estaria a criar uma crise artificial no país, dificultando a paz e a estabilidade. Em segundo lugar, interpreto de três formas o pedido de parecer que Jomav fez aos dois constitucionalistas portugueses [o Prof.
Vital Moreira e o próprio Prof.
Jorge Miranda] a respeito da [in]constitucionalidade da perda de mandato dos 15 deputados do PAIGC. Primeira interpretação:
Jomav pretende acusar o Poder Judicial
guineense de falta de confiança,
de incompetência e de parcialidade no seu papel de pilar da
justiça na Guiné-Bissau. Segunda
interpretação: Jomav está a transmitir aos guineenses que existem infiltrados (Toupeiras) nos principais órgãos de
Poder na Guiné-Bissau. Terceira
interpretação: pode significar que Jomav pretende dizer ao país e aos
guineenses que cabe aos Juristas
portugueses fazer a interpretação das leis da Guiné-Bissau, tendo em conta
que, além de terem sido criadas por eles,
tanto a Constituição da República da
Guiné-Bissau «CRGB» como o modelo guineense são cópias da Constituição da República Portuguesa «CRP»
e do modelo português (Angop, 28-01-2016; Sapo Notícias, 02-02-2016).
Desde a democratização
de Portugal, algumas faculdades de Direito português, em geral, e alguns
dos seus professores de Direito Constitucional, em particular, têm aconselhado e acompanhado de perto (e
até influenciado) as escolhas institucionais dos países
lusófonos (Lobo & Neto, 2009: 15, 16, 21; Novais, 2007: 137-139). A
este respeito, Azevedo (2009: 142) diz-nos que «[…] um dirigente partidário
guineense (que pediu o anonimato) denunciou que a ambiguidade e a inadaptação da Constituição às características do
país resultam de esta ter sido redigida
por juristas portugueses. Segundo este dirigente, a actual Constituição
resulta principalmente do trabalho de três importantes juristas portugueses convidados pelas autoridades guineenses».
Esta “batata quente” que Jomav passou aos dois constitucionalistas
portugueses vai ao encontro das declarações do Dr. Basílio Sanca, Bastonário
da Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau, que defende uma «reforma integral a
nível nacional na área da justiça» e
da advocacia. Basílio Sanca
reconhece a existência da corrupção na
Guiné-Bissau, em especial no campo da justiça, afirmando que esta se deve essencialmente
ao “Sistema”, que está mal montado e
deve ser revisto porque não corresponde
à realidade do país (Rádio
Sol Mansi, 08-02-2016). Esta declaração de Basílio Sanca, além de dar
razão a Jomav para não confiar na
justiça guineense, legitima que o PR possa “lavar as mãos à moda de Pilatos[1]”.
3ª parte: Recordo aos leitores que o facto da CRGB e do modelo
político guineense serem cópias da CRP e do modelo político português provam,
por um lado, exemplo vivo do
caso descrito pelo grande realista clássico, Maquiavel:
«[…] nada é tão débil e
instável como a fama do Poder que se baseia em forças alheias […], e deu-nos o exemplo da vitória de
David sobre Golias, que recusou as armas
de Saúl enfrentando assim o seu inimigo com a sua funda e a sua
faca […], em conclusão, as armas de outrem ou não te assentam bem, ou te pesam ou te apertam […]» (Maquiavel, 2007: 63-66). Por
outro lado, as constantes intervenções
de constitucionalistas portugueses nas interpretações das leis da
Guiné-Bissau e da pressão da Comunidade Internacional no destino da
Guiné-Bissau podem ser enquadradas nesta metáfora da confrontação de Hrothgar para Beowulf ao
revelar-lhe que «[…] as pessoas pensam que, para ser Rei, só é preciso uma Coroa de Ouro e basta. Pensam que, lá porque eu a
uso, sou mais sábio que elas. Mais corajoso e melhor (…). Um dia, irás compreender o
preço… que é preciso pagar pelos favores dela, e pelo Trono também.
Haverás de saber o que é sentirmo-nos um fantoche, a baloiçar dos fios que nos manipulam [...]»
(Kiernam, 2007: 153-156, 183-190).
4ª parte: Face à realidade da Guiné-Bissau, os mediadores
do conflito são unânimes em reconhecer que os governantes guineenses devem esforçar-se a todo custo para resolver os seus problemas e para
se livrar das constantes
dependências externas - até porque a Comunidade Internacional mostra estar já saturada da instabilidade na Guiné-Bissau (RFI,
11-02-2016). Se a CRGB e o modelo guineense são cópias da CRP e do modelo português (antiga potência colonial),
então a Guiné-Bissau não pode ser um
país plenamente independente. Sendo
assim, torna irrefutável a tese de que «a descolonização não é o fim do colonialismo, mas sim, a
implementação de um conjunto de medidas tendentes a terminar com o controlo
político formal sobre os territórios coloniais e a sua substituição por um novo tipo de relacionamento» (Lara, 2000: 22).
E reforça a posição dos que acreditam que «a
guerra e a política são faces da mesma moeda. Ou seja, se entendemos a
guerra como a continuação da política por outros meios, então devemos perceber
também que a política é a continuação de guerra com outros meios» (Arendt,
2007: 125; Cabral, 2008: 142-143; Foucault, 2002: 283; Kosta, 2007: 646; Medeiros,
2012: 144-145; Mendes, 2010: 33).
Se pudermos realmente
chegar à conclusão que o modelo guineense actual não é satisfatório, porque não implementar um novo modelo,
criado de raiz, com base na realidade da Guiné-Bissau?
Para mais informações,
consultar o meu livro: Mendes, Livonildo Francisco (2015). Modelo Político Unificador – Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau (pp. 163, 186-188, 281, 345). Lisboa: Chiado Editora.
[1] O imperador romano
Tibério nomeou Pôncio Pilatos como Governador/Prefeito da província romana da
Judeia entre os anos de 26 e 36 d. C. Foi o Juiz que, de acordo com a Bíblia,
condenou Jesus Cristo à morte na
cruz, depois de uma consulta popular, em que deu a escolher à população entre a
salvação de Jesus e a de um ladrão de nome Barrabás. Os tribunais judaicos
administravam a justiça no dia-a-dia, mas casos que exigiam a pena de morte
eram submetidos ao Governador romano, que era a autoridade judicial suprema (A
Sentinela, 15-09-2005).
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