Caros leitores, pretendo
apresentar neste post dois exemplos (Braima Camará e Manuel Nascimento Lopes) que
ilustram tanto a acumulação de cargos na Guiné-Bissau como a politização e
partidarização de todos os sectores da sociedade guineense.
Como enquadramento a este
texto, recordo aos meus leitores que
existem duas alas com posições
opostas dentro do PAIGC[1]. Nesta ordem de ideias, passo a apresentar dois exemplos que mostram como os problemas do partido-Estado
PAIGC estão a afectar a sociedade guineense,
espalhando-se como uma infecção, que
se tem verificado em todos os
sectores. Existem muitos outros exemplos de acumulação de cargos, em ambas as alas, mas estes exemplos servem apenas para apresentar o tema, uma vez que resultam de duas notícias actuais.
Em primeiro
lugar, temos o exemplo de Braima Camará
«Bá-Quekutô». O Tribunal Regional
de Bissau considerou nulas todas as deliberações tomadas na Assembleia Geral da Câmara do Comércio, Indústria, Agricultura
e Serviços da Guiné-Bissau (CCIAS),
realizada a 4 de Abril de 2015, e que elegeu o Empresário Braima Camará como seu Presidente
para um segundo mandato. Na sequência desta eleição, foi criada uma nova Câmara de Comércio (CDC-GB), por iniciativa de membros descontentes com a situação na
CCIAS. Perante esta decisão por
parte do Tribunal Regional de Bissau, devemos questionar-nos qual é o efeito desta anulação face à criação da nova Câmara de Comércio. Apesar da violência
e das perturbações na eleição de Braima Camará, na altura, o escrutínio foi considerado justo e transparente. E hoje, passado
quase um ano, em que ficamos? O que
motivou esta reviravolta? Importa assinalar que Braima Camará é um dos 15
Deputados expulsos do PAIGC, e além de desempenhar as funções de Presidente
da Assembleia Geral da CCIAS, é Conselheiro de Estado, Membro do Bureau
Político do PAIGC, para além de Empresário
e Presidente de um clube desportivo…(ANG,
10-03-2016; Gazeta de Notícias, 11-12-2015).
Em segundo lugar, temos o
exemplo de Manuel Nascimento Lopes
«Manelinho», que é também um dos 15
Deputados expulsos do PAIGC, Empresário
e Presidente da Federação de Futebol da
Guiné-Bissau (FFGB). Por um lado, o Governo
guineense, representado por Conduto
de Pina, Secretário de Estado do Desporto da Guiné-Bissau, acusa a FFGB de irresponsabilidade e esbanjamento,
ameaçando retirar a esta entidade o
seu estatuto de utilidade pública.
Conduto de Pina acusou de forma implícita o Presidente da FFGB, Manuel
Nascimento Lopes, de, ao invés de gerir a instituição, “passar a vida a
insultar o Governo” (Sapo Notícias, 11-03-2016). Por outro lado, a FFGB suspendeu o campeonato devido à falta de dinheiro. A suspensão
do campeonato acontece numa altura em que o Sporting é líder, com 17 pontos, mais 3 do que o Benfica que segue
na segunda posição (A Bola,11-03-2016). Vale a pena perguntar, uma vez que a eleição de Manelinho para o
seu cargo também foi polémica, como
seriam as coisas se as relações destes 15 Deputados com o PAIGC não tivessem degenerado? Se os
contestatários solicitassem a anulação da
eleição de Manelinho para a presidência da FFGB, será que também seria
anulada, como aconteceu com Braima Camará?
Perante estes factos,
parece-me evidente que a acumulação de
cargos é um dos grandes problemas
que afectam a sociedade guineense. Além
disso, no modelo político em vigor, existe uma falta
de clarificação sobre o papel de cada órgão e instituição, o que resulta,
inevitavelmente, em conflitos sem
solução. No meu entender, todos os
sectores públicos e privados da Guiné-Bissau estão politizados e partidarizados
pelo partido-Estado PAIGC. É nesta perspectiva que emerge a necessidade de pedir um divórcio definitivo, derivado
da dependência política entre os
órgãos superiores do Estado e também de outras instituições, visto que, ao
longo dos anos o ambiente político entre eles tem sido de grande instabilidade política (Mendes, 2010:
92, 93).
Relativamente à acumulação de cargos, poderia ser
resolvida através da criação de um órgão
que proponho no modelo apresentado no meu livro – a Áreas de Estudos – Órgão Consultivo Multidisciplinar Imparcial
(AE-OCMI). Este órgão teria a seu cargo a função
de examinar junto dos serviços públicos casos de funcionários com dois ou mais empregos, para proceder de
imediato à escolha de um dos empregos por parte do funcionário, no sentido de permitir
o acesso ao emprego por parte de um maior número de pessoas (Hunter, 2004: 33;
Mendes, 2010: 93).
Finalmente,
uma das soluções mais urgentes passa
pela reforma/modernização da política,
com destaque para o PAIGC e pela profunda
mudança de mentalidades (o que exige um investimento forte na educação).
Para mais informações,
consultar o meu livro: Mendes, Livonildo Francisco (2015). Modelo Político Unificador – Novo Paradigma de Governação na
Guiné-Bissau (pp. 474, 531-532). Lisboa: Chiado Editora.
[1] Há, por um lado, a “ala pró-DSP
(Domingos Simões Pereira)” que é uma “reencarnação” do ex-Primeiro-Ministro «ex-PM» Carlos Domingos Gomes
Júnior «Cadogo Jr.». E está explícito que esta ala pró-DSP, o Governo do PM Carlos Correia e do Presidente de Assembleia Nacional Popular «ANP» Cipriano
Cassamá (com a esmagadora maioria dos Deputados do PAIGC) estão em consonância.
E, por outro lado, há a “ala pró-Jomav (José Mário Vaz)” que está a tentar
corrigir as falhas dos ex-Presidentes da República «ex-PR» João Bernardo Nino Vieira e Malam Bacai Sanhá. E
está implícito que Jomav, o Partido da Renovação Social «PRS» e os 15 Deputados
expulsos do PAIGC estão também em consonância. Se DSP pretende uma solução que
passa pela realização de novas eleições para consolidar o seu Poder, Jomav quer
evitar tudo o que possa engrandecer e aumentar o carisma de DSP. Mais informações no post anterior.
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