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sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Origem da língua crioula falada na Guiné-Bissau e em Cabo Verde

Caríssimos leitores, este post deve ser articulado com o anterior. Assumo a responsabilidade de desconstruir a “narrativa” sobre o crioulo, evitando que se “compre gato por lebre”. Mais uma vez, sugiro que leiam as páginas 101-117 do meu livro, para maior aprofundamento deste tema. O próximo post encerra uma série de três, debruçando-se sobre a relação de Cabo Verde com África.

É preciso perceber que uma língua crioula é a que serve de veículo comum entre falantes de dialectos diferentes. Por exemplo, na Guiné-Bissau, a língua crioula resulta de contactos políticos e comerciais  entre os portugueses e os povos do Golfo da Guiné (principalmente os Mandingas e os Fulasdesde a época do Grande-Império do Mali, no século XIII. Na Guiné-Bissau, esta língua começou a ser aperfeiçoada com maior intensidade a partir do século XVI, numa altura em que os Mandingas dominavam o comércio na região de Kaabu (Gabú), que estava em grande expansão e desenvolvimento. Por isso a língua crioula é também utilizada na Gâmbia e no Sul do Senegal, em Casamança. É interessante compreender o papel desempenhado pela língua Malinké/Mandinga na formação do crioulo da Costa Ocidental africana muito antes do surgimento dos caboverdianos. Por isso, importa sublinhar que, no caso do crioulo de base lexical portuguesa, a base vocabular africana provém do malinké (Bull, 1989: 55; Lopes, 1982: 38, 87; 1999: 154-156; 2005: 26; Mendes, 1992: 69; Mendes, 2010: 19).
Esta ordem de ideias abre-me um novo horizonte para o conhecimento de Cabo Verde. Apesar de ser um país povoado, na sua maioria, por escravos da Guiné-Bissau, o povo caboverdiano não fala praticamente nenhum dialecto dos grupos étnicos que lhe deram origem. Isso faz-me crer que a divisão ou não em grupos étnicos é muitas vezes um facto artificial e relativo. É artificial porque pode ser imposto, como foi no caso de Cabo Verde, do Brasil e dos EUA, que são exemplos paradigmáticos de “Novas Colónias” onde as divisões étnicas foram totalmente suprimidas e incorporadas pela cultura e língua dominantes, tornando-se países mais “coesos e unidos”. É relativo na medida em que pode sofrer fortes transformações ao longo do tempo, ao ponto de já não fazer sentido falar em grupos étnicos, ou seja, acaba por culminar com o seu esquecimento ou desaparecimento.
O facto de os Malinkés/Mandingas serem considerados “maus falantes” do crioulo poderia levar-me a questionar o seu papel na criação desta língua. No entanto, creio que o facto de alguém (neste caso, um grupo étnico) estar na origem de um fenómeno não o torna, necessariamente, especialista nesse fenómeno (neste caso, “bom falante”). Adaptado à linguagem política, posso dizer que o facto da Antiga Grécia ser o “berço da Democracia ocidental”, isso não faz da actual Grécia uma Democracia mais sólida do Ocidente. Por esta via mantenho a minha posição de que a origem do crioulo seja Malinké, apesar de, posteriormente, a sua apropriação por uma camada de crioulos constituída por Afro-Portugueses, com a sua história e consciência histórica ligadas à presença colonial, poder ter feito desaparecer dos vocábulos a identificação Malinké[1]. Com base na mesma linha de pensamento, faço uma analogia entre o Império Romano e o “Grande-Império” do Mali, que pode ser aplicada ao domínio cultural. Tal como o latim que, através do Império Romano, deu origem a muitas línguas europeias – portuguesa, francesa, italiana, espanhola –, foi assim que a língua Malinké, pelo domínio do “Grande-Império” do Mali, deu origem à língua crioula e a muitos dialectos da sub-região cujos países e grupos étnicos estavam sob domínio dos Mandingas. Isto indica que mesmo na camada Afro-Portuguesa, a influência Mandinga-Kaabunké (Gabú) foi importante e que o Malinké está também na origem da componente africana da cultura desta camada da população (Djaló, 2012: 154; Lopes, 1999: 155-158, 166-184, 227-228).
O que muitas vezes não é explicado por pensadores contemporâneos diz respeito ao “pidjin”, que foi a “língua franca” que evoluiu para o crioulo que nós conhecemos hoje. O “pidjin” é considerado como um Sistema incompleto utilizado na comunicação com pessoas pertencendo a uma outra comunidade linguística. Há quem defenda que não é uma língua materna de ninguém e a sua utilização responde a necessidades de comunicação precisas. Enquanto o crioulo é a língua materna de um grupo de locutores, e enquanto tal, deve responder ao conjunto das suas necessidades linguísticas. A transição do “pidjin” para o crioulo implicou fortes modificações socioculturais (Bull, 1989: 55-57; Djaló, 2012: 154; Lopes, 1999: 156-158, 166-184, 227-228).
Face a todas as considerações anteriores, importa agora refutar a tese, popularizada por alguns autorespró-caboverdianos”, de que a actual Guiné-Bissau seria uma colónia de uma colónia, ou seja: que Portugal teria colonizado Cabo Verde e que, por sua vez, Cabo Verde teria colonizado a actual Guiné-Bissau. Esta tese baseia-se no argumento de que as duas colónias foram governadas, em certos períodos de tempo, pelos mesmos Governadores com residência em Cabo Verde, que teriam domínio sobre a Administração da actual Guiné-Bissau. De acordo com estes autores, só em 1879, com o decreto de 18 de Março, a actual Guiné-Bissau teria recebido a sua autonomia administrativa, passando a cidade de Bolama a ser a segunda capital da actual Guiné-Bissau (depois de Cacheu) (Cardoso, 2002: 12-13; Kosta, 2007: 185; Lara, 2000: 100-103; Pélissier, 1989: 29, 41, vol. I).
Como referi anteriormente, todos os dados indicam que foram os escravos guineenses que deram origem à atual população de Cabo Verde e, por consequência, ao crioulo que hoje é uma das línguas oficiais do arquipélago, a par da língua portuguesa. Aliás, a nomeação [30-03-1834] de Honório Pereira Barreto [24-04-1813 a 16-04-1859] para o cargo de Governador da Guiné-Portuguesa, demostra que o território não era uma colónia de Cabo Verde. É curioso perguntar sobre quem seria o colonizador se os portugueses não tivessem ido para a actual Guiné-Bissau. Já que os portugueses chegaram no século XV, depois da etnia Mandinga no século XIII e da etnia Fula no século XIV, posso imaginar uma resposta simples e directa – os Mandingas seriam colonizadores, visto que, os Impérios do Mali e de Gabú exerceram um Poder dominante na Guiné-Bissau. Os Mandingasdeixaram de exercer o seu Poder quando os Fulas receberam o apoio de armas de fogo dos portugueses e obtiveram a vitória na famosa batalha de Kansala de 1867. A mesma questão sugere-nos que, se os portugueses não tivessem ocupado a actual Guiné-Bissau, talvez Cabo Verde não existisse ou talvez fosse um território muito diferente do actual (Duarte Silva, 1939: 1-8; Kosta, 2007: 185-188, 204; Lopes, 1982: 63, 88; 1988: 10; 1999: 166-184; Mendes, 2010: 20-21; Silva, 2010: 23, 31).
Para mais informações, consultar o meu livro: Mendes, Livonildo Francisco (2015). Modelo Político Unificador - Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau (pp. 111-117). Lisboa: Chiado Editora.


[1] Neste sentido, discordo em absoluto de alguns comentários públicos como o comentário do poeta caboverdiano José Luís Tavares, quando afirma que “o crioulo de Cabo Verde é o pai de todos os crioulos que existem” [no programa televisivo Conversas ao Sul da RTP África] (RTP África, 22-01-2015).

28 comentários:

  1. Excelente artigo e bastante esclarecedor.

    De facto noto que os cabo-verdeanos procuram a todo custo assumir o crioulo , tentando inclusivamente de forma patriarca resumir a originalidade do dialeto sem qualquer sentido.

    Quem conhece ou fala as 2 línguas como eu , entende perfeitamente qual é a mais antiga , apesar de assumirem que o kriol tem uma variação maior que o crioulo pela composição do povo em mais de 25 etnias , é evidente que a língua falada na Guiné- Bissau é a original.

    Nem de forma histórica faria sequer sentido pensarem que os escravos foram raptados para cabo-verde e depois foram lançados para ensinar os guineenses a falar crioulo.

    Mesmo na assunção da sua origem , os cabo-verdeanos numa estratégia de Estado no ensino ( pois o povo nada tem a ver com isso) , resume o aparecimento do povo como consequência de "união" entre colonizadores portugueses e alguns povos da costa ocidental africana , depois mais alguns povos europeus como por exemplo os italianos...

    Sabem quem é o pai , mas a mãe foi uma qualquer da África ocidental que se apaixonou por um padre português.

    Há uma fuga direta na sua identidade enquanto povo para uma aproximação europeia tal como demonstra a nova bandeira , a renegação das origens africanas , e agora pretendem particularizar o "crioulo" , que é como se assumem como povo.

    Crioulo não implica miscigenação , que não ocorreu tanto na Guiné Bissau como em Cabo Verde , mas sim o convívio dos povos que leva à origem de uma cultura , mas os cabo-verdeanos confundem o mulato com o crioulo.

    A procura da oficialização da língua , é para afirmar-se como os "primeiros e originais crioulos" , a Guiné deve estar atenta a este movimento.

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  2. Este artigo é fantástico porque ajuda nos a desvendar a polêmica sobre a origem da língua crioula.

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  3. Não sei daonde que José Luis Tavares tirou a comprovação da teoria monegenetica dos crioulos que é so mais uma de entre as outras que não foram definitivamente comprovadas ainda. Do mesmo modo que o autor que o contesta acaba sendo muyito mais impreciso. De onde veio que os protugueses tiveram contacto com o império Mali no sec XIII? quando é que os portugueses dobraram o cabo bojador? e como apurou que Cabo Verde teve tribos da Guiné? em que documentação se baseou para saber a proveniencia dos escravos que ficaram em Cabo Verde se hoje não se sabe seus nomes nem origem especifica?
    o ultimo exame de DNA realizado não chegou a identificar as tribos!

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  4. quando coloca os portugueses a contactar os do Mali no sec XIII acaba afirmando que os portugueses conheciam africa a sul do sahara antes da crise do sec XIV. com que tecnologia eles chegaram tão longe? antes do nascimento do Infante Henrique? antes da peregrinação de kankan Musa? hoje sabe-se que foi essa peregrinação que atiçou a cobiça dos europeus para se aventurarem na procura do ouro ao sul? como pode fazer tanta confusão

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  5. Partilho este post não porque concordo com o seu articulado, mas porque há que repor a verdade histórica. Não sou historiador, mas aprendi que a história faz-se com factos e não com simples impressões.
    Segundo o historiador António Carreira, várias etnias da Costa ocidental africana foram trazidas para Cabo Verde, como escravos (uma vintena). Não acredito que tenham vindo apenas da Guiné-Bissau. Aliás, o Professor Jürgen Lang, alemão, apresenta provas irrefutáveis da grande influência do Wolof no crioulo de Cabo Verde (cf. Les Langues des Autres dans la créolisation -Théorie et Exemplification par le Créole d'Empreinte Wolof à l'île de Santiago du Cap-Vert, 2009, Gunter Narr Verlag Tübingen).
    Como se pode perceber que os escravos vindos da Guiné-Bissau foram portadores apenas do crioulo e não das suas línguas maternas étnicas. Como se percebe que os que ficaram em Cabo Verde impuseram o seu "crioulo" e o mesmo não aconteceu em outras paragens onde foram levados, como o Brasil, por exemplo? Há que revisitar a data da chegada dos portugues a Guiné-Bissau e a Cabo Verde, a data e a duração do estabelecimento das feitorias, bem como a formação da sociedade escravocrata nas duas regiões.

    Na devida altura, com fundamento histórico, falarei da origem do crioulo caboverdiano. Não o faço agora porque à história tenho que recorrer e eu não sou historiador. Fica o compromisso.

    Manuel Veiga, Caboverdiano, Linguista

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    1. De facto, professor! de sublinhar, ainda, que o dado apresentado pelo professor Lang é um achado valioso que chega a ser uma verdadeira bênção, deitando por terra os argumentos de muitos estudiosos que davam o crioulo.cv como o português mal falado, resultado de sua simplificação por parte dos proprios colonos, (colocando os europeus como crioulisadores) dado que deixa sem resposta a pergunta sobre como os colonos aprenderam as estruturas do wolof presentes até hoje no crioulo. Se pela lógica, por um lado, os crioulizadores foram os próprios africanos (e não os europeus) o império do Mali está longe de ter feito isso tanto no tempo (desapareceu antes do povoamento destas ilhas), como no espaço e nas circunstâncias (salvo se o autor deste post possui dados que explicam como e o porquê de uma relação tão intensa entre os mandingas e os portugueses, 200 anos antes do inicio do trafico atlantico, ao ponto de saberem e poderem meter 99 % de palavras portuguesas numa gramática wolof).

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  6. Sima Avram Noam Chomsky ta splika, kriolus (fidjus di skravus nasidu i kriadu na ilhas) ki bira pidgins di rispetivus projenitor na linguas kriolu. Ceteris paribus pa kriolu kabuverdianu. Maioria di kes otu 90 i tal kriolu sobriviventi, kuazi tudu surji i ta izisti na ilhas. Surjimentu di kriolu na kontinenti e raru i se sobrivivensia inda mas raru. Pois normalmenti so algen sen alternativa ta kria novu lingua...

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    1. Desta opinião não entendi patavina...

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    2. Anonimu ka ntende patavina provavelmenti pabia el ka ta ntende lingua ki sa ta papiadu del. Pur isu, el ka ten ki ntende nada mesmu!

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    3. Basear se que o crioulo foi inventado em CB porque "so alguém sem alternativa é que cria uma língua " não tem lógica nenhuma, e centenas de línguas faladas por toda a África foram criadas tmbm. Como disse o Autor deste artigo ,quem fala os dois krioulos percebe bem qual é o primeiro. Suma ku pudi odja , nta papial tudu dus.
      Badiu é claramente kriolu da Guiné.

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    4. Badiu é ka nada kriolo di Guiné. É sim kriolo di Santiago-

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  7. A lingua franca (/ ˌlɪŋɡwə fræŋkə /), [1] também conhecida como linguagem de ponte, linguagem comum, linguagem comercial ou linguagem vehicular, é uma linguagem ou dialeto sistemático (em vez de ocasionalmente, ou casualmente) usado para facilitar a comunicação entre pessoas que não compartilham uma língua ou dialeto nativo, particularmente quando é uma terceira língua que é distinta de ambas as línguas nativas. [2]
    Lingua francas desenvolveu-se em todo o mundo ao longo da história humana, às vezes por razões comerciais (as chamadas "linguas comerciais"), mas também por conveniência cultural, religiosa, diplomática e administrativa e como meio de troca de informações entre cientistas e outros estudiosos de diferentes nacionalidades. [3] [4] O termo se origina com uma dessas línguas, o Mediterrâneo Lingua Franca.

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  8. Uma quistão a colocar; Sera que os Malinkés falavam um mais ou menos o criolo antes da gurra do cansala?
    Em que ano os Portugueses forneceram as armas aos fulas,os quais foram utilizados na guerra de cansala?

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  9. Durante esses anos que tenho vividos junto dos caboverdianos aqui na Nova Englaterra ( Estados Unidos ) pude constatar de que muitos caboverdianos se quer tem conhecimento das suas origens, pois apresentam-se como como crioulo ou descendentes dos portugueses, e em alguns casos os americanos lhes chamam black portuguese ou pretogues, Fazem de tudo para se distanciarem da mae africa ( Guine Bissau ) e andam a estudar a historia de portugal e brasil nas escolaa publicas em Cabo Verde. Tudo isso deixa os caboverdianos num posso sem saida e vivem numa profunda ignorancia e ao mesmo tempo carecem das suas proprias identidades por nao saberem a historia real de cabo Verde. A africanidade nao se pode esconder meus irmaos caboverdianos, ela esta no nosso ADN pois ela vai onde quer estejamos, a nossa fisionomia diz claramente o que somos, portanto deixem a ignorancia de lado, e orgulhem-se de serem o que sao, filhos da mae africa, isso vai aliviar a vossa consciencia e destruir essas graves barreiras culturais que existem na vossa mente.

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    1. Sr. Antonio esse seu comentario me parece um bocado agressivo e pejorativo, voce ja esteve em Cabo verde?
      ja percebi voce e daqueles que dava a tua vida pa nasceres cabaverdiano.

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    2. Burrice sr. anónimo. Porque tenta de forma pejorativa afastar os caboverdianos da sua origem também europeia (pretogues sim) porque se nossas mães são desconhecidas (Africanas cujas origens desconhecemos) mas temos nas nossas caracteríticas físicas e não só a confirmação de que somos filhos de pretos com um Português colono. Nosso ADN diz que somos pretoguês (krioulos, filhos de preta e de Português).

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    3. O comentário do sr António, peca por precariedade. Nós somos ilhéus e de cruzamentos entre raças e não de entre povos que o autor do texto muito bem explanou.Em Cabo Verde houve sim cruzamentos de várias raças, inclusive de Judeus e daí a mestiçagem criola.

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  10. Parabéns pelo artigo bastante elucidativo e esclarecedor. Penso que, apesar de aspetos pouco dignos de aproveitamento dos avanços recentes, toda a verdade mantém-se verdade e ela deve ser devidamente reposta...Obrigado !

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  11. Artigo bem preciso e esclarecedor. Mas cada um é livre de puxar brasa a sua sardinha, o estado da Guiné-Bissau deve assumir de uma vez por toda o protagonismo do crioulo, promovendo espaços de debates a volta da sua história e língua.

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  12. Gostei do post, é muito interessante. Só quero fazer um apelo para todos. Vejo que muitos usaram a palavra " OS ESCRAVOS"... vale a pena lembrar que nunca e ninguém jamais nasce ESCRAVO, seria melhor substituir para "OS ESCRAVIZADOS". Parabéns Manuel Veiga.

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  13. Discussão interessante. Enquanto pesquisador e linguista,consigo reconhecer limitação do artigo considerando a proposta que discurso científico requer. A ciência não se faz mediante argumentos tacanhos (sejam eles da nossa autoria ou por citações).
    Produzir um artigo dessa natureza (Origem da língua Crioula) requer não apenas um amplo levantamento bibliográfico, mas também assumir um exercício intelectual interdisciplinar, abrangendo os pressupostos teóricos que enveredam sobre questões das línguas Crioulas. Nas literaturas das línguas Crioulas, vimos (vide Hipótese da relexificação na gênese dos crioulos e pidgins 2002 de Hildo Honório do Couto) diferentes posições que apontam para processos de formação das línguas Crioulas. Sim, concordo com você por deixar indícios no seu discurso de que a hipótese contida na teoria evolutiva arraigada na ciência da linguagem, principalmente na lingusitica tradicional não tem sustentação científica, porém a hipótese da relexificação (juntamente com gramaticalização, nivelamento e reanálise) prevê que a formação dos crioulos e dos Pidgins não são aleatórios e caóticos, ou seja, em situação de contato linguístico, principalmente nos contextos multilíngue/ pluriétnico, os formadores dessas línguas pegam significante (ou parte dele) da língua dominante e o associam a significados e possibilidades combinatórias de suas próprias línguas. Dessa forma meu caro amigo/irmão,fica difícil aceitarmos que Crioulo vem de Mandinga. Uma coisa é uma etnia (ou lingua dessa etnia) fornecer maior parte de léxicos no processo de formação da língua crioulo em detrimento das outras. Quando estamos falando de origem da língua Crioula, precisamos considerar os processos de hibridização ou crioulização que nortearam sua formação .Reiterando, os processos sociais, políticos e econômicos.
    Numa definição técnica e precisa, assumimos que língua Crioula é o produto de pidgin quando se torna língua materna de uma comunidade linguística.
    Por outro lado, me parece que você não conseguiu identificar a evolução da língua Crioula. Existe variação da língua crioula. Portanto, considerando variação existente nessa língua, estamos falando de que Crioulo ? Baseletal, Nativizado ou Aportuguesado ?
    Veja bem, percebi uso constante de conceito "dialeto" na sua fala. Ao usarmos esse conceito livremente ,estamos reproduzindo a lógica colonial que coloca distinção entre língua e "não língua"/"dialeto". E, foi comprovado de que não existe nenhuma fundamentação científica na distinção das duas variedades linguísticas enquanto línguas vivas.



    Pois bem, nao existe nenhuma fundamentacao cinetifica Enquanto pesquisador linguista,

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  14. Gostaria de contribuir com o seguyinte texto: O CRIOULO DA GUINÉ-BISSAU É UMA LÍNGUA DE BASE PORTUGUESA?
    link:https://ppg.revistas.uema.br/index.php/jucara/article/view/1758/1350

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  15. Muito obrigado a todos os que comentaram este post. Infelizmente não tenho, neste momento, tempo para responder a cada comentário individualmente, mas recomendo vivamente que leiam a argumentação completa no meu livro. O blog é um espaço para textos curtos, onde não cabe todo o discurso científico em torno deste tema, mas na minha obra estao todas as fontes que justificam os meus argumentos.
    Conto convosco para continuar a alimentar este debate.

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  16. Eu como filho de Cabo-verdiano sou africano e ponto, embora tenha nascido em Portugal. Mas muitos cabo-verdianos dizem que não sou porque nasci em Lisboa! Sou africano e mais nada, estou sempre à procura da minha verdadeira historia e gostei de ler muita coisa aqui isto não se aprende na escola..

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  17. A raiz do crioulo, tanto o falado em Cabo Verde, como o falado na Guiné, como o "papiâ cistan" da Malásia ou o "patuá de Macau", também chamado de "papiâ cristan di Macau" são similares e quem usa um destes falares, compreende os outros não obstante as especificidades de cada uma. Isto prova, para já que a génese deles é a mesma. A base linguística que os une é exatamente o português falado nos séculos XVI, XVII, XVIII..., cujas expressões populares usadas em zonas rurais,especialmente de Trás-os-Montes, Beira Alta, Beira Baixa, Alentejo e Algarve, ainda hoje, demonstram esta parentalidade.
    As diferenças patentes em cada crioulo ficam a dever-se às interferências mais africanas (Guiné Bissau), mais asiáticas (Macau e Malásia) ou mais europeias (Cabo Verde). Neste último caso, a interpenetração do crioulo e do português atual é por demais evidente com a utilização de advérbios de modo, do uso de masculino e feminino e do singular e plural ( no crioulo, tal não existia), da conjugação verbal para além de outros aspetos.
    Sobre a origem dos escravos africanos em Cabo Verde, hoje é muito fácil ser determinado através do estudo do ADN de cada pessoa. A minha parte africana corresponde à que se encontra na Serra Leoa, e no Quénia. Portanto, nada da costa da Guiné. E tive conhecimento de vários outros cruzamentos, para além da ibérica e da africana que sabia, completamente desconhecidos e que assim ficarão, na maior parte, por já não ter os meus pais vivos não podendo saber de quem recebi os genes da Itália, Grã-Bretanha e Dinamarca, por exemplo, que foram identificados.
    Quem quer mesmo saber a sua origem que peça a análise do seu ADN. Terá, de certeza, surpresas autênticas pois, na verdade, Cabo Verde, acabou por ser um cadinho onde muitos povos se fixaram e cujas origens se perderam. Muitos que se consideram só africanos, teriam a surpresa de encontrar alguma percentagem, por mais pequena que seja, num outro continente; do mesmo modo que aqueles que muitos consideram ou se consideram brancos, são afinal fruto de uma grande misturada. Não se é, nem mais nem menos, nem se pode ter mais ou menos direitos, por se ter antepassados africanos ou europeus ou seja de que continente for.
    O que é certo é que a origem africana de todo o ser humano é um facto. Portanto a "globalização" da HUMANIDADE não se iniciou com as descobertas de portugueses e espanhóis. O que ninguém lhes tira é que, devido aos conhecimentos e respetivos registos escritos, pôde ser feita a sua divulgação por todos os continentes e de modo imparável, passando a ser partilhado, à medida também dos conhecimentos e desenvolvimentos científicos de cada região e de cada povo.
    A HISTÓRIA é uma CIÊNCIA e o seu OBJETO DE ESTUDO é o PASSADO. E, por não ter o mesmo objeto de estudo que as outras ciências que são laboratoriais, o MÉTODO de estudo que usa é outro e baseia-se em FONTES HISTÓRICAS, em DOCUMENTOS, quer NÃO ESCRITOS quer ESCRITOS, sendo ambos importantes, necessários e indispensáveis.
    Só a História nos permite conhecer e entender o presente. As nossas raízes são o que são e não o que alguém queira que seja.

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  18. Obrigado por ter partilhado esta visão baseada nos estudos!Confesso que aprendi muita coisa hoje, tanto pelo teu post como pelos comentarios que foram feitos,dos quais fiz a questão de ler todos com muita atenção.
    Espero continuar a aprender contigo e com todos!

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